A seca extrema que atinge os rios amazônicos desde o ano passado já afeta mais de 420 mil crianças e comunidades ribeirinhas e indígenas no Brasil, Colômbia e Peru, segundo alerta do Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef), em nota divulgada nesta quinta-feira, 7.
De acordo com o órgão internacional, os choques climáticos “estão deixando crianças sem acesso à educação, suprimentos de alimentos e outros serviços vitais à medida que os rios atingem níveis devastadores”.
O problema ocorre porque a grande seca, que desde o ano passado tem se intensificado na bacia amazônica, deixa os níveis dos rios baixos, pois estes são as fontes de suprimento para as famílias, que delas dependem para transporte de suprimentos, alimentos, água, combustível, medicamentos e acesso à escola.
Além disso, pontua o Unicef, serviços essenciais, incluindo saúde, educação e proteção infantil, bem como meios de subsistência agrícolas e pesqueiros, também estão severamente afetados na região, colocando vidas em risco.
“Durante séculos, a Amazônia foi o lar de preciosos recursos naturais. Estamos testemunhando a devastação de um ecossistema essencial do qual as famílias dependem, deixando muitas crianças sem acesso a alimentos, água, cuidados de saúde e escolas adequados”, disse a diretora executiva do Unicef, Catherine Russell, em nota.
“Devemos mitigar os efeitos das crises climáticas extremas para proteger as crianças hoje e as gerações futuras. A saúde da Amazônia afeta a saúde de todos nós”, completou.
Escolas e centros de saúde fechados
O Unicef ressalta que a Amazônia abrange nove países da América do Sul e, somente na região amazônica brasileira, mais de 1.700 escolas e mais de 760 centros de saúde foram fechados ou ficaram inacessíveis devido aos baixos níveis de água. Na última avaliação de campo do Unicef, em 14 comunidades no Sul da Amazônia brasileira, metade das famílias informou que seus filhos estão fora da escola por causa da seca.
Ainda de acordo com o levantamento do Unicef, na região amazônica colombiana, houve queda de 80% nos níveis de água dos rios, restringindo o acesso à água potável e ao abastecimento de alimentos, e levando à suspensão das aulas presenciais para crianças em mais de 130 escolas. A consequência desse quadro é o aumento do risco de recrutamento, uso e exploração dessas crianças por grupos armados e não estatais. Também há aumento de infecções respiratórias, doenças diarreicas, malária e má nutrição aguda entre crianças menores de cinco anos.
No Peru, a região de Loreto, no nordeste do país, é a mais afetada pela seca deste ano, isolando comunidades remotas – a maioria indígenas e já vulneráveis. “Mais de 50 centros de saúde tornaram-se inacessíveis, enquanto os incêndios florestais – muitas vezes causados pelo homem, mas cuja propagação foi facilitada pelas secas dos últimos dois meses – também estão causando devastação sem precedentes e perda de biodiversidade em 22 das 26 regiões do país e aumentando a poluição do ar local e regionalmente”, informou o Unicef.
“A insegurança alimentar causada pela seca aumenta o risco de má nutrição, atraso no crescimento e perda de peso e morte em crianças, principalmente nas menores de 5 anos, enquanto a escassez de água agravada pelas secas pode levar a um menor acesso à água potável e ao aumento de doenças infecciosas. A pesquisa também descobriu que as mulheres grávidas que enfrentam secas provavelmente terão filhos com menor peso ao nascer”, constatou o órgão internacional.
A estimativa do Unicef é de que sejam necessários US$ 10 milhões nos próximos meses para atender às necessidades mais urgentes das comunidades afetadas pelas secas no Brasil, Colômbia e Peru, incluindo a distribuição de água e outros suprimentos essenciais, mobilização de brigadas de saúde e fortalecimento da resiliência dos sistemas comunitários e serviços públicos locais nas comunidades indígenas afetadas.
Catherine Rudell salienta que, em todas as partes do mundo, as crianças enfrentam consequências devastadoras das crises climáticas e devem estar no centro das negociações sobre o tema.
Por conta disso, uma das demandas do Unicef aos líderes, antes do início da Conferência das Nações Unidas sobre a Mudança do Clima (COP 29), que começa na próxima semana no Azerbaidjão, é para que realizem quatro ações críticas para crianças e jovens:
1 – Garantir que as decisões da COP29 respondam ao impacto único e desproporcional das mudanças climáticas nas crianças;
2 – Garantir um aumento dramático no financiamento climático para crianças, incluindo financiamento para adaptação e perdas e danos.
3 – Garantir que todas as NDCs (Contribuições Nacionalmente Determinadas) 3.0 sejam sensíveis às crianças e respondam ao impacto desproporcional das mudanças climáticas nas crianças; e
4 – Capacitar crianças e jovens a estarem presentes e participarem significativamente da tomada de decisões climáticas em todos os níveis.